quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Que Paixão!!!

Depois de já ter testemunhado algumas madrugadas numa das mais belas e idílicas lagoas da Serra da Estrela, surge a ocasião de concretizar aquilo que tanto almejava: pernoitar na Lagoa da Paixão para fotografar o pôr e o nascer-do-sol.
A «Expedição Pé Furado» designada pelos quatro expedicionários da jornada - eu próprio, Marco Santos Marques, Pedro Santos e Ana Catarina Silva - surge ironicamente quando na véspera, o elemento feminino da comitiva, teve um pequeno incidente na planta do pé esquerdo, colocando em risco a sua própria participação, mas sem nunca beliscar qualquer propósito desta incursão, como em jeito de chacota foi declarado pelos restantes membros do grupo. Felizmente para a Ana Catarina Silva e afortunadamente para a expedição o problema foi atempadamente resolvido, sob as mãos cuidadosas de Elsa Leitão que para além desta meticulosa tarefa, participou afincadamente na logística da viagem.
A Expedição propriamente dita iniciou-se pelas quatro horas da tarde do dia 28 de agosto, numa curta viagem de carro que ligou a Vila de Manteigas e o local do início da caminhada até à Lagoa da Paixão. Chegados à zona das Salgadeiras - Torre, foi o momento de repartir o peso das mochilas entre os expedicionários, pois para além do equipamento fotográfico e tripés, havia que transportar o essencial da alimentação e a roupa de aconchego para a noite.
Carregado o material às costas, deixamos a nossa boleia que nos levou ao ponto de partida desta aventura. A caminhada iniciou-se já perto da quatro e meia da tarde. Pela frente algumas exigências, tendo em conta não só o próprio traçado, mas o desnível acentuado do percurso.
Pouco mais de uma hora de caminhada, surge a tão esperada chegada à Lagoa da Paixão.
«Em meu gosto, é a mais bonita lagoa da serra». É com esta simplicidade que Emygdio Navarro, no livro «Quatro Dias na Serra da Estrela» (1884), descreve a Lagoa da Paixão ou do Peixão como também é assim referenciada na carta militar.
Localizada a 1.666 metros de altitude, na cabeceira do Vale da Candeeira, Concelho de Manteigas - Serra da Estrela, sob a vigia sobranceira do Cântaro Gordo e a proteção do Fragão do Passarão e do Fragão do Poio dos Cães.
Após um pequeno e descontraído descanso das costas e ombros que suportaram o equipamento, era o momento de eleger o sítio para pernoitar que deveria assentar em dois princípios básicos: fora do alcance dos enquadramentos das objetivas e o mais protegido do vento.
Escolhido o local e depois de um ligeiro lanche, era a altura de verificar o melhor enquadramento para o pôr-do-sol que apressadamente declinava para além da montanha, com o propósito de captar o reflexo do recorte do Cântaro Gordo na Lagoa da Paixão.
Já debruçado sobre a Lagoa da Paixão, a decisão passou por descalçar as botas, despir as calças, entrar na água tépida e molhar as pernas um pouco acima dos joelhos.
Acomodado dentro de água com o amparo do tripé, surgiam os primeiros registos desta épica aventura. A serenidade sobrepunha-se a tudo e a todos os que estávamos no local.



À medida que a hora avançava, já muito mais não seria de esperar da luz do final deste dia na Lagoa da Paixão. Apenas sobrava tempo para contemplar a magnitude da paisagem. Mas pacientemente aguardava dentro das águas mornas da Lagoa, como que alguém me dissesse para não renunciar o enquadramento, quando nas minhas costas sob o Fragão do Poio dos Cães o céu ganhava cores quentes proporcionadas pela obliquidade do sol no horizonte. A tonalidade cinza que envolvia a «Paixão» num ápice mudou para um azul celestial e sem esperar o sol beijava subtilmente o pico do Cântaro Gordo.



A realidade era manifesta. Uma dádiva da mãe natureza, sem nunca imaginar o quão belo estaria ainda para suceder. A adrenalina avassalou o meu corpo, extasiado de tanta emoção. Incrédulo, as pernas dentro de água fraquejavam… quando inesperadamente sob a língua de fogo que desaparecia subtilmente no cume do Cântaro Gordo, surge tenuemente um arco-íris!


Um cenário de conto de fadas, a exceder o irreal e o imaginário. Mas o supremo estaria ainda para ocorrer. O arco-íris que se iniciou na cumeeira do Cântaro Gordo depressa rasgou os céus e abraçou a Lagoa da Paixão.


Sem palavras para transmitir a inquietação vivida neste final do dia na Lagoa da Paixão!
Com o aproximar da noite e depois de uma hora e meia dentro de água, estava na altura de enxugar rapidamente as pernas, pois com o corpo molhado a temperatura sentida era bastante inferior à real.
Arrumado o equipamento fotográfico na mochila, convergimos ao local onde iriamos pernoitar. Apesar das diferentes visões sobre os instantes ali passados, o sentimento era comum a todos os expedicionários: uma enorme satisfação perante tal exultação da mãe natureza.
Após mais um reforço alimentar e com o céu apresentar já pouca nebulosidade, oportunidade ainda para captar alguns registos noturnos na Lagoa da Paixão.
Passavam poucos minutos da meia noite. Altura de esticar o corpo, com o despertador já apontado para as seis horas da manhã.
O despontar do dia 29 de agosto surge apressadamente. Retemperar forças com o pequeno-almoço e dirigimo-nos até à margem da Lagoa da Paixão para captar o momento em que o sol iluminaria o Fragão do Poio dos Cães.


Um dos últimos registos da «Expedição Pé Furado». Depois de arrumar todo o material e carregar aos ombros as mocilhas - passavam alguns minutos das oito horas da manhã - iniciava-se a caminhada ascendente que nos levava até ao local da partida - Salgadeiras.
O sol escaldante e as súbidas mais íngremes do percurso, obrigaram a ligeiras paragens para ingerir líquidos. Era necessário ganhar fôlego e ânimo para o que restava da caminhada.
Cerca das dez horas da manhã entramos no carro que nos conduziu até à Vila de Manteigas, com a bagagem repleta de histórias e resgistos fotográficos inesquecíveis.

E assim se constroem amizades… numa jornada fotográfica muito difícil de superar, onde as emoções sentidas ficarão para sempre gravadas nas nossas vidas!!!